terça-feira, 28 de julho de 2009

Reflexões sobre a Política de São Paulo

Pegando o período de 88 para cá, temos um quadro interessante no estado. Paralelamente ao processo de redemocratização - pelo menos no aspecto formal -, São Paulo prossegue no seu ritmo alucinante de transformações econômicas, mas desta vez, o viés é oblíquo na região metropolitana: Se a região se tornou superpopulosa principalmente nos anos do regime militar a desindustrialização dela resulta numa hecatombe social.

Por outro lado, o interior, depois de passar anos vendo sua população emigrar para a Capital, acaba não padecendo dos problemas urbanos dela - ou não na mesma intensidade -, movido pelo crescimento da agroindústria e recebendo muitos investimentos que fogem da Metrópole, ele passa a ser o motor do crescimento do estado, o que, no entanto, não significa muito: Em um período em que o país se encontra no refluxo do modelo desenvolvimentista, com baixas taxas de crescimento e altos índices de inflação, o estado cresce menos do que a média nacional.

Nesse quadro, tivemos a divisão das forças políticas quase de maneira perfeita entre direita, centro e esquerda:

1.Um terço se alinha no campo conservador, saudoso dos tempos da ditadura e ainda crente de que é o modelo industrialista que vá salvar a economia local. Esse grupo se alinha com o Malufismo, corrente demagógica personificada na figura de Paulo Maluf, o herdeiro político da ditadura no estado assim como ACM no nordeste.
2.Polarizando com esse grupo, temos a esquerda, que finalmente sai do campo restrito da Academia com o advento do novo sindicalismo nos fins dos anos 70 - que já refletia a preocupação dos trabalhadores com o fenômeno de desindustrialização. São um grupo heterogêneo que por vezes briga entre si, mas é unido pela repulsa à Ditadura Militar e a preocupação com os direitos sociais. O PT, naquele momento, é o grande catalisador dessas forças.
3.Temos, por fim, o centro. Ele é formado por pessoas que são céticas demais em relação ao que foi a Ditadura, mas que por outro lado, não são socialistas. Nesse momento histórico, o PMDB, histórico representante dessa ala já começa a ser aparelhado pelo Quercismo e o PSDB já se forma, vindo a ser herdeiro dessa tradição nos anos 90.

Enfim, são essas três forças que vão se equilibrar no poder dali em diante: O Malufismo, o Tucanismo (ao centro com o Covismo) e o Petismo. É esse equilíbrio político-partidário tênue conjugado com os ditâmes da desindustrialização da região metropolitana, avanço do interior e favelização urbana que, a via de regra, explica os resultados das eleições de lá pra cá.

Pegando especificamente a capital, temos um vitória inesperada de Luiza Erundina em 88. É o momento em que se afirma o terço esquerdista - e mesmo que o eleitorado de centro ainda não considerasse votar em um candidato de esquerda, a ausência de segundo turno favoreceu a candidata do PT. O governo Erundina é um emaranhado de boas intenções, traz um secretariado de peso (com figuras como Marilena Chauí e Paulo Freire), mas esbarra nas brigas internas dos campos do PT e numa inoperância interna. Os efeitos disso são desastrosos: Maluf é eleito prefeito em 92 e faz sucessor em 00. A decadência econômica da cidade que não é contida pelo Governo Erundina é catalisada pela administração Malufista: A cidade encolhe e empobrece nos anos 90.

Paralelamente a isso, o Quercismo deixa um estado em frangalhos e Mário Covas vence e inicia o aquele que seria o longo período do PSDB no estado. Se elege e reelege em meio a tensão Malufismo x Petismo e em 1998, vence com o apoio providencial de Marta Suplicy que disputou voto a voto com ele a vaga no Segundo Turno contra um ainda poderoso Maluf. Essa aliança se repete em 00 nas eleições municipais na Capital, quando Marta passa pelo candidato tucano Geraldo Alckmin e vai disputar com Maluf o Segundo Turno - do qual sai vitoriosa.

As vitórias de Marta e Covas jogam a direita paulista na maior crise de sua história: Graças a elas, o Malufismo implodiu. Eis que a grande mudança de rumo acontece e muda o panorama: Covas morre e os caciques tucanos manobram o partido para a direita pra abraçar o antigo eleitorado malufista. O vice de Covas, Alckmin, é manobrado pelos oligarcas do interior e o PSDB rapidamente se torna o partido conservador do estado. É nessa condição que ele entra nas eleições de 2002 e que o partido se estabelece desde então - e marca a vitória de Alckmin contra Genoíno no estado. Marta perde em 2004 para um Serra que foi varrido por Lula nesse clima. 2006 é o ano em que Suplicy é o único petista a vencer no estado, frente as derrotas de Mercadante e Lula no estado para Serra (agora como governador) e Alckmin (na presidencial que Lula acaba vencendo). Em 2008, Marta perde para Kassab numa eleição estranha, onde o Serrismo começa a se autonomizar em relação ao Tucanismo.

Teses como as de Chico Oliveira que falam em um certo teto em São Paulo são um engano. A desindustrialização da capital não podem ser o início do fim da esquerda no município, pois esse campo político se afirma politicamente devido a iminência desse fenômeno. Mas ela exige um novo modo agir para os mais variados setores da esquerda, haja vista que estamos uma realidade que não é mais industrial e dificilmente voltará a ser. Eleitoralmente falando, o que hoje é o eleitorado tucano mais raivoso e extremista era justamente aquela ala que votava em Maluf nos anos 90 - e não necessariamente o eleitorado covista clássico -, portanto, a explicação de um conservadorismo crônico do estado que muitas vezes é levantado por alguns petistas, nada mais é que uma cortina de fumaça para campanhas mal-feitas, brigas internas intermináveis e a falta de elaboração de políticas públicas voltadas para o estado - ou uma crítica mais decisiva sobre os (muitos) problemas do estado gerados ou não resolvidos no longo governo tucano. Também é um paradoxo, porque aponta que o eleitorado mais antigo do PSDB é justamente aquele que é mais propenso a votar no PT numa eleição e é o mais volátil - o que também diz muito sobre a fragilidade do partido azul e amarelo.

Por ora, os três campos permanecem emparelhados.

4 comentários:

  1. Ótimo texto! O PSDB assumiu ser de direita, ou melhor, perdeu a vergonha de ser direita com a morte de Mário Covas. O Mino Carta tem ótimos textos sobre o freio que Covas representava na guinada à direita do PSDB. Uma vez, ele diz, o FHC quis ser ministro do Collor. Covas não deixou.

    Belo texto.

    Abraços,

    Marcelo.

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  2. Marcelo,

    De fato, Covas representava um freio moral e uma tentativa de firmar o PSDB como o partido que escapasse a um suposto extremismo indo pelo meio e representando uma certa normalidade - que passava pelo meio da demagogia autoritária de um Maluf ou da ideia de democracia popular do Petismo.

    FHC, por sua vez, é uma figura que sempre teve sua formação intelectual superestimada; representou a seu tempo um esquerdismo extremista e como tal, estava condenado a fazer movimentos pendulares conforme os interesses ou a qualquer mudança conjuntural momentânea; na política, sempre externou um maquiavelismo ratasqueiro.

    Obviamente, Covas cometeu erros graves no seu Governo; pegou a economia do estado em frangalhos, mas levou adiante um plano de estabilização duvidoso e com consequências sociais ruins. No entanto, há uma larga diferença entre uma pessoa como ele que acreditava no que fazia e tinha lá seus valores para um fantoche presunçoso como Alckmin ou uma figura como Serra - que parece ter mandado às favas os escrúpulos de consciência há muitas décadas.

    abração

    abraços

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  3. Ótimo texto, Hugo.

    Li assim que você publicou, mas só agora tive um tempinho para passar aqui e registrar. Excelente meu caro, abraço

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